quinta-feira, 6 de outubro de 2016

A VISÃO DOS PAIS ANTENICENOS E NICENOS SOBRE AS ESCRITURAS (c. 150-c. 350)

       Depois dos Pais subapostólicos, os Pais do final do segundo século e dos seguintes também nos proporcionam um forte testemunho a respeito da origem divina das sagradas Escrituras. Dentre estes, temos Justino Mártir, Tatiano, Ireneu, Clemente de Alexandria, Tertuliano, além de outros.
Justino M ártir (falecido 165)
Na sua primeira Apology (Apologia) (c. 150-155 d.C.), Justino Mártir se referiu aos Evangelhos como a “Voz de Deus” (capítulo 65). Ele acrescentou: “Não devemos supor que a linguagem procede de homens inspirados, mas sim da Divina Palavra que os move” 1.36). Em outro lugar, ele declarou que Moisés escreveu em caracteres hebraicos por "inspiração divina”, e que “o Espírito Santo de profecia nos ensinou isto, dizendo-nos por Moisés que Deus assim falou” (JHOG, 12, 44).
Tatiano (c. 110-180)
       Como discípulo de Justino, Tatiano chamou João 1.5 de “Escritura”, na sua Apology Apologia) (capítulo 13). Nesta obra, Tatiano fez uma defesa apaixonada do Cristianismo e o considerou tão puro aponto de ser incompatível com a civilização grega. Ele também escreveu uma harmonização dos Evangelhos, o Diatessaron (c. 150-160), que revela um grande respeito pela sua autoridade divina.
Irineu (c. 130-202)
       No seu tratado Against Heresies (Contra as Heresias) (3.1.1), Ireneu se dirigiu à autoridade divina do Novo Testam ento, declarando:
       Pois o Senhor de todos deu o poder do Evangelho aos seus apóstolos, por intermédio de quem recebemos o conhecimento da verdade, isto é, o ensino acerca do Filho de Deus [...] Este Evangelho foi, primeiramente, pregado por eles. Depois, pela vontade de Deus, eles no-lo passaram por intermédio das Escrituras, para serem o “chão e pilar” da nossa fé (AH, 3:67).
De fato, Ireneu afirmou a sua crença na inerrância das Escrituras, proclam ando “a Fé nas Escrituras e na Tradição”, na qual ele reconhecia os apóstolos com o estando “acima de toda falsidade” (3.5.1). Ele chamou a Bíblia de “Escritura da  verdade”, e foi “assegurado da maneira mais adequada a respeito da perfeição real das Escrituras, já que foram faladas pela Palavra de Deus e por seu Espírito” (ibid., 2:28.2; 2.35).

Clemente de Alexandria (c. 150-215) 

Clemente se tornou o líder da Escola Eclesiástica de Alexandria no ano 190 d.C., mas foi forçado a fugir em face da perseguição ocorrida no ano 202 d.C. Ele sustentava uma doutrina rígida a respeito da inspiração, a qual pode ser vista na sua obra Stromata:
Não existe discordância entre a Lei e o Evangelho, mas sim harmonia, pois ambos procedem do mesmo Autor [...] diferindo em nome e época para se encaixar à culturados ouvintes [...] por intermédio de uma sábia economia, que é, potencialmente, a mesma [...] já que a fé em Cristo e o conhecimento [...] do Evangelho é a explicação [...] e o cumprimento da Lei (Westcott, AISG, 439).
Clemente de Alexandria também chamou o evangelho de “Escritura” no mesmo sentido em que se referia à Lei e aos Profetas, ao escrever sobre “as Escrituras [...] na Lei, nos Profetas, e no mais pelo bendito Evangelho [...] [que] são válidos por sua autoridade onipotente”. Ele chegou ao ponto de condenar os que rejeitavam a Escritura por “não estarem contentes com os mandamentos divinos, isto é, com o Espírito Santo” (Geisler, DFY, 31-32).

Tertuliano (c. 160-220)

       Tertuliano, o “Pai da Teologia Latina”, jamais hesitou no seu apoio à doutrina da inspiração tanto do Antigo quanto do Novo Testamento. De fato, ele sustentou que os quatro Evangelhos “foram criados na base segura da autoridade apostólica e, portanto, são inspirados em um sentido completamente diferente dos escritos dos cristãos espirituais; é verdade que todos os fiéis têm o Espírito de Deus, mas nem todos são Apóstolos” (Westcott, AISG, 434). Para Tertuliano: [Os] apóstolos têm o Espírito Santo de forma apropriada, pois o têm de forma plena, na operação da profecia, e na eficácia das virtudes [de cura], e na evidência das línguas; não de forma particular, como todos os outros as têm. Assim, ele reuniu a autoridade do Espírito Santo a essa forma [de avisos] os quais Ele esperava que fossem respeitados; e imediatamente ela se tornou não somente um aviso do Espírito Santo, mas, levando em consideração a Sua majestade, um preceito (“OEC”, in: Schaff, NPNFCC, 4).

Hipólito (c. 170-236)

       Hipólito, um discípulo de Ireneu, apresentou o mesmo sentido profundo de reverência para com as Sagradas Escrituras. Referindo-se à inspiração do Antigo Testamento, ele disse:
A Lei e os Profetas vieram de Deus, que, ao entregá-los, impeliu o seu mensageiro a falar pelo Espírito Santo, para que, recebendo a inspiração do poder do Pai, pudessem anunciar o seu conselho e a sua vontade. Nestes homens, portanto, aquele que é a Palavra encontrou uma habitação apropriada e falou de Si mesmo; pois se tornaram, então, os seus próprios arautos, a anunciar a Palavra que estava prestes a aparecer no mundo (Westcott, AISG, 431-32).
A respeito dos escritores do Novo Testamento, Hipólito declarou: Estes homens abençoados [...] tendo sido aperfeiçoados pelo Espírito de Profecia, e valorosamente honrados pela própria Palavra, foram levados a uma harmonia interior como se fossem instrumentos, e tendo a Palavra dentro de si, para fazer soar as notas, por Ele foram tocados, e anunciaram aquilo que Deus desejou [...] [Pois] eles não falaram pelo seu próprio poder (que isto fique bem claro), nem proclamaram o que eles mesmos queriam, mas, primeiramente, foram dotados com sabedoria pela Palavra, e, depois, foram bem instruídos a respeito do futuro por intermédio de visões, para, só então, tendo tudo isso assegurado, falarem daquilo que Deus [revelou] somente a eles (Westcott, AISG, 432). 

Origenes (c. I85-C.254)

       Orígenes, sucessor de Clemente na Escola de Alexandria, sustentou que Deus “deu a lei, e os profetas, e os Evangelhos, sendo também o Deus dos apóstolos, e do Antigo e do Novo Testamento”. Ele escreveu: “Este Espírito inspirou cada um dos santos, fossem eles profetas ou apóstolos; e não havia um Espírito nos homens da antiga dispensação, e outro naqueles que foram inspirados no advento de Cristo” (Schaff, NPNFCC, 4:240). A visão que Orígenes tinha da autoridade das Escrituras era de que “as Escrituras foram escritas pelo Espírito de Deus, e possuem um significado [...] que não é conhecido por todos, mas somente por aqueles sobre quem a graça do Espírito Santo é concedida nas palavras de sabedoria e conhecimento” (ibid., 241). Ele continuou afirmando a existência de um elemento sobrenatural de raciocínio “ao longo de toda a Escritura, até mesmo onde ele não fica aparente para o não-instruído” (Geisler, DFY, 28-30). 

Cipriano (c. 200-258)

       Cipriano foi um bispo importante na Igreja do Oriente, durante a época do imperador romano Décio (249-215 d.C.). No seu tratado The Unity of the Catholic Church (A Unidade da Igreja Católica), Cipriano recorre à autoridade dos Evangelhos, referindo-se a eles como “mandamentos de Cristo”. Ele também acrescenta as cartas de Paulo aos Coríntios à sua lista de escritos com autoridade e apela à carta de Paulo aos Efésios (4.4-6). No mesmo local, ele reafirma a inspiração do Novo Testamento, quando escreve: “Quando o Espírito Santo diz, na pessoa do Senhor [...]”. Ele, novamente, acrescenta: “O Espírito Santo nos alerta por intermédio do apóstolo”, ao citar 1 Coríntios 11.19 (TTJCC, 5:126). Estes exemplos e vários outros encontrados nos seu escritos levam à conclusão de que Cipriano considerava tanto o Antigo quanto o Novo Testamento como “Escrituras Divinas” (EACN, 5:328). 

Eusébio de Cesaréia (c. 263 ou 265-340)

       Como o grande historiador da igreja antiga, Eusébio é uma testem unha importante dos pontos de vista relativos à Escritura no período da igreja nascente. Ele sustentou a inspiração tanto do Antigo quanto do Novo Testamento e escreveu muito a respeito da Palavra de Deus na sua Ecclesiastical History (História Eclesiástica). Eusébio foi a pessoa encarregada de fazer as cinqüenta cópias das Escrituras depois do Concilio de Nicéia (325). Ele foi um grande detensor das Sagradas Escrituras, escrevendo de forma ampla sobre o tema. Suas obras relacionadas incluem Against Hierocles (Contra Hierócles) (um governador pagão da Bitínia), The Preparationfor the Gospel (O Preparo para o Evangelho), e Demonstration of the Gospel (Demonstração do Evangelho). Na parte superior destes escritos, ele escreveu um trabalho sobre a Encarnação que recebeu o título de The Theophany (A Teofania), e ele também escreveu outro livro (Against Marcellus, Bishop of Ancyra [Contra Marcelo, Bispo de Ancira]) que é uma coleção de passagens do Antigo Testamento que predizem a vinda de Cristo. Além dessas, estão: Prohlems of the Gospels (Problemas dos Evangelhos [Shaff, 2.a série, Volume 1, 36]) e On the Theology of the Church, a Refutation of Marcellus (Sobre a Teologia da Igreja, uma Refutação a Marcelo). Acrescente-se a estas o seu tratado sobre a Easter (Páscoa) e seu On the Names oj Places in the Holy Scriptures (Sobre os Nomes de Lugares nas Sagradas Escrituras) (Onomastica Sacra), para servir de base à sua plena defesa da Bíblia como Palavra de Deus divinamente inspirada.

Atanásio de Alexandria (c. 295-373)

       Conhecido como o “Pai da Ortodoxia”, por causa da sua resistência bem-sucedida contra o Arianismo (a heresia que negava a divindade de Cristo), em Nicéia (325 d.C.), Atanásio foi o primeiro a utilizar o termo “cânon” em relação aos livros do Novo Testamento, aos quais chamava de “fontes da salvação” (Westcott, AGSHCNT, 456). Atanásio cita freqüentemente as Escrituras como possuindo autoridade e a palavra final na resolução de questões doutrinárias.

Cirilo de Jerusalém (c. 315-386)

       Cirilo apresentou o que ele chamou de resumo “da doutrina completa da fé” que “foi construída de maneira firme a partir das Escrituras como um todo”. Então, continuou a alertar os outros a não modificar ou contradizer os seus ensinos, em função do impedimento encontrado em Gálatas 1.8,9 (Cirilo de Jerusalém, in: Schaff, 7:32). No seu tratado Of the Divine Scriptures (Das Divinas Escrituras), ele fala das “Escrituras divinamente inspiradas tanto do Antigo quanto do Novo Testamento” (ibid., 26-27). Ele então continua a listar todos os livros do Antigo Testamento hebraico (vinte e dois) e todos os livros do Novo Testamento cristão, com exceção de Apocalipse (vinte e seis), dizendo: “Aprenda também diligentemente, e com a Igreja, quais são os livros do Antigo Testamento, e quais são os do Novo. E, ore, não leia nenhum dos escritos apócrifos”. Para Cirilo, o assunto foi esclarecido quando escreveu: Com respeito aos mistérios divinos e salvadores da fé, nenhuma doutrina, mesmo trivial, pode ser ensinada sem o apoio das Escrituras divinas [...] pois a nossa fé salvadora deriva a sua força, não de raciocínios caprichosos, mas daquilo que pode ser provado a partir da Bíblia (ibid., conforme citado em ECD, de J. N. D. Kelly, 4).

Resumo da Posição dos Primeiros Pais da Igreja sobre as Escrituras

       Praticamente todos os Pais da igreja antiga aderiram de forma entusiástica à doutrina da inspiração tanto do Antigo como do Novo Testamento. J. N. D. Kelly, uma autoridade na área de doutrina da igreja primitiva, afirmou: Existe pouca necessidade de nos delongarmos mais acerca da autoridade reconhecida das Escrituras como norma doutrinária. Era a Bíblia, declarou Clemente de Alexandria, cerca do ano 200 d.C., que, interpretada pela Igreja, era a fonte do ensino cristão. O seu grande discípulo Orígenes foi um biblista exaustivo que apelou inúmeras vezes às Escrituras como o critério decisivo para o dogma [...] “A Escrituras sacramente inspiradas”, escreveu Atanásio, um século mais tarde, “são completamente suficientes para a proclamação da verdade”. Mais tarde, no mesmo século, João Crisóstomo disse à sua congregação que não buscasse nenhum outro mestre além dos oráculos de Deus [...] No Ocidente, Agostinho [...] [e] pouco tempo depois, Vicente de Lerins (c. 450) tiveram por axioma [que] “o cânon das Escrituras era suficiente, e mais do que suficiente, para todos os propósitos” (ECD, 42-43).

       Em suma, os Pais da igreja antiga criam que tanto o Antigo como o Novo Testamento eram escritos inspirados pelo Espírito Santo por intermédio da instrumentalidade dos profetas e dos apóstolos. Eles também criam que as Escrituras eram completamente verdadeiras e sem erro, porque eram a própria Palavra de Deus que nos foi entregue como base de fé e prática de todos os crentes.

João Vitor - apologista e membro da Liga Cristã Contra as heresias

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